Rua: São Francisco Xavier, 75 - Tijuca - Rio de Janeiro, RJ
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Destaques, Notícias Gerais › 05/02/2015

Uma declaração de amor ao bairro da Tijuca, Rio de Janeiro.

Venho de uma família de tijucanos: pai, mãe, avós paternos e maternos, tios, etc. Todos tijucanos de carteirinha.

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Fui criada na Tijuca, onde estudei e fiz os amigos que me acompanham até hoje. Amigos de primário e ginásio – era como se chamava o ensino fundamental naquela época – Amigos da Tijuca. Sim, AMIGOS! Como Wanderléa, Roberto e Erasmo Carlos; Tim Maia e Jorge Babulina, hoje Ben Jor, todos originários da Tijuca que também é terra de Ivan Lins e Gonzaguinha, Aldir Blanc e Cesar Costa Filho, etc.

Podemos, com orgulho, afirmar que a Jovem Guarda teve o seu berço na Tijuca, no antigo Bar Divino, na Rua Haddock Lobo, esquina com a Rua do Matoso.

Bar  Divino patota-carioca.blogspot.com.brAli se reuniam, para tocar e cantar Elvis, os “tremendões” que embalaram as tardes dos sábados da nossa Jovem Guarda.

sfxavie r 1583Não temos praias, mas temos florestas, temos cascatas, praças, clubes e até serra, pertencemos à antiga freguesia do Engenho Velho – o primeiro engenho de cana de açúcar da região, posteriormente denominada de São Francisco Xavier do Engenho Velho, devido à construção, pelos jesuítas, da Igreja de São Francisco Xavier em 1583, de acordo com GERSON, Brasil, História das Ruas do Rio, 1965, p.442.

 E olha só… essa mesma Igreja, com mais de 400 anos, várias vezes reconstruída,  testemunhou fatos muito importantes em minha vida. Palco do casamento de meus pais em 1950, da comemoração de suas Bodas de Prata e ainda da celebração das missas de 7º dia dos dois – parece mesmo que eles escolheram iniciar e terminar sua caminhada juntos ali, na Capelinha dos Jesuítas. A Igreja ainda enfeita, com imponência, nossa paisagem, resistindo às agruras da modernidade e servindo de cenário para as histórias dos tijucanos de carteirinha, como eu.

bonde3 (1)Ah… e os bondes da Tijuca. Eram muitos e cruzavam todo o bairro. Enfeitados e barulhentos, no carnaval eram só alegria. Passavam lotados de bate bolas, tiroleses, piratas, havaianas e até gregos… Mas eu gostava mesmo era do bonde do Alto da Boa Vista – esse significava PASSEIO. Serpenteando a Av. Edson Passos, o bonde subia a serra, enquanto o vento fresco batia em nossos rostos ansiosos, até chegarmos à praça com a escultura do leão, pano de fundo de tantas fotografias de nossa de infância.

Ali brincávamos, corríamos, gritávamos e acabávamos por descansar aos pés da exuberância do leão talhado em mármore branco. Por falar em esculturas, a cultura sempre foi forte em nosso bairro.

colegio santa terezaImportantes e tradicionais colégios, públicos e particulares estão aqui localizados.  Cursei o ensino fundamental (primário e ginásio) no Colégio da Cia. Santa Teresa de Jesus, criado e dirigido pelas irmãs Teresianas, num casarão onde existiu o primeiro internato do Colégio D. Pedro II, em 1858.  Nossos uniformes com saia de lã “pied de poule”, blusa branca e gravata, deram lugar às calças jeans e as “T shirts” coloridas, mas a escola, ainda tradicional do bairro, continua contribuindo com o mesmo padrão de educação para crianças e jovens.

Colegio-Militar-do-Rio-de-Janeiro1Vários são os colégios de importância ainda existentes na velha Tijuca, dentre eles está o tradicional Colégio Militar, de 1889, que em seu processo de modernização, abriu suas portas ao público feminino, introduzindo assim charme e delicadeza à antiga instituição.

213_2641-Patio interno formaturaNão se pode deixar de falar do famoso Instituto de Educação que, durante décadas, alimentou o sonho de tantas jovens em se tornarem normalistas – profissionais dedicadas à educação básica.  Infelizmente, apesar de a Escola ainda existir no bairro, o sonho da profissão parece ter saído dos anseios das jovens da atualidade.

Como não se lembrar dos cinemas da Tijuca?  Nas primeiras décadas século XX, as salas de projeção proliferaram em nosso bairro que chegou a oferecer quase 10.000 lugares em cinemas. Só o lendário cinema Olinda, inaugurado em 1940, oferecia 3.500 lugares, segundo o livro “A segunda Cinelândia Carioca – cinemas, sociabilidade e memória na Tijuca”  de  Talitha Ferraz.

cine OlindaNessa “pequena Cinelândia”, assisti a deliciosos filmes com Doris Day e Rock Hudson, me encantei com a história de My Fair Lady  e  até, levada por minha mãe, me emocionei com  nosso Mazzaropi em Zé do Periquito. 

Os cinemas emolduraram por muito tempo a popular Praça Saens Peña que centralizava o lazer do bairro.

Por conta deles – os cinemas -, algumas turmas de jovens se formaram ao longo dos anos, eram as “gangs” de nossa época.  Existia a “turma do Bob’s” composta de jovens de vários bairros que ali se reuniam para esperar as meninas saírem dos cinemas e a turma do Palheta formada pelos rapazes mais velhos que disputavam com a turma do Bob’s as mesmas meninas.

 Com o passar dos anos, a Tijuca caiu nas teias da modernidade: ganhamos metrô, prédios altos, shopping, muitas lojas e… um crescimento desordenado foi ocupando as encostas que são muitas em nosso bairro.

Perdemos em de qualidade de vida.

Com o ocaso de nossa Cinelândia, as salas de projeção passaram a fazer parte do Shopping… e a velha Praça perdeu a alegria dos domingos e das férias escolares.

362807Nossa Praça, destruída com as obras do metrô, depois de longos anos dilacerada volta ao cenário totalmente remodelada, incorporando essa nova modalidade de transporte à rotina do bairro.

E a Praça ganhou outro tipo de usuário. Trocou a garotada barulhenta dos finais de semana por nossos idosos, que ali se reúnem, todas as tardes, para jogar um carteado amigo. Ganhamos também a “rua das flores”, linda com suas barraquinhas floridas todos os dias e em todas as estações – não conheço outro bairro que dedique uma rua inteira ao colorido das flores.

 Vários outros aspectos, menos pitorescos, foram sendo incorporados à vida dos tijucanos, aspectos do dito desenvolvimento: o caos no trânsito pelo excesso de carros, os maus tratos, pela falta de manutenção de nossas ruas e calçadas, buracos em nossas pedras portuguesas, bueiros que explodem e a insegurança do “ir e vir”. Mas nada disso é um privilégio do meu bairro.

Muitos tijucanos saíram do bairro e, buscando a antiga qualidade de vida, desembarcaram na Barra da Tijuca. Será que acharam o que procuravam? Ou será que acabaram trocando “seis por meia-dúzia”? Ganharam a praia e perderam a facilidade do andar a pé e ter tudo pertinho, de conhecer os vizinhos, de olhar vitrines de rua, cumprimentar o jornaleiro… e se fecharam em redomas gradeadas.  Talvez alguns pensem ter ganhado em “status”, mas há controvérsias.  O que talvez nem todos saibam é que, fugindo de suas origens na Tijuca, acabaram por cair no local que originou o nome de nosso bairro…  é isso mesmo,  o nome TIJUCA vem do tupi –Ty-iuc,  significa lama , terreno alagadiço, pântano, fazendo referencia ao lado de lá da Serra, lado da Lagoa da Tijuca na Baixada de Jacarepaguá, por ser  uma terra alagadiça.

Acabamos por constatar que temos fortes raízes dessa origem tijucana, mesmo quando passamos para o lado de lá do Maciço.

E olhem o que escreveu nada mais nada menos do que José de Alencar – aquele da Iracema – a virgem dos lábios de mel, a Machado de Assis – de Bentinho e Capitu, apresentando Castro Alves – o do Navio Negreiro.

“Felizmente estava eu na Tijuca. O senhor conhece esta montanha encantadora. A natureza a colocou a duas léguas da Corte, como um ninho para as almas cansadas de pousar no chão. — Aqui tudo é puro e são. O corpo banha-se em águas cristalinas, como o espírito na limpidez deste céu azul. — Respira-se à larga, não somente os ares finos que vigoram o sopro da vida, porém aquele hálito celeste do Criador, que bafejou o mundo recém-nascido.” – (Carta de José de Alencar à Machado de Assis apresentando Castro Alves; 18 de fevereiro de 1868).

Somos sim, “tijucanos da gema”, temos o amarelo ouro da gloriosa época da aristocracia da nobre Tijuca, talvez por isso tenhamos a fama de bairristas e conservadores e …. POR QUE, NÃO?

Texto de Sonia Fragozo (Uma declaração de amor ao bairro da Tijuca, Rio de Janeiro, publicado no Blog UrbeCarioca, em 26 de outubro de 2012).

 

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